Deus existia no princípio, mas nós recebemos da tradição que o Princípio é a potência do Verbo. Com efeito, o Senhor do universo, que é por si mesmo o sustentáculo de tudo, enquanto a criação não tinha ainda sido feita, estava só. Mas enquanto estava com ele toda a potência do visível e invisível ele próprio sustentou tudo consigo mesmo, por meio da potência do Verbo. Por vontade de sua simplicidade sai o Verbo e o Verbo, que não cai no vazio, gera a obra primogênita do Pai.
Sabemos que ele é o princípio do mundo, mas produziu-se não por divisão, e sim por participação. De fato, o que se divide, fica separado do primeiro, mas o que se faz por participação, tomando caráter de uma dispensação, não deixa em falta aquilo de onde se toma. Da mesma forma que de uma só tocha se acendem muitos fogos, mas o fato de acender muitas tochas não diminui a luz da primeira, assim também o Verbo, procedendo da potência do Pai, não deixou sem razão aquele que o havia gerado. É assim que eu mesmo estou falando e vós me escutais e certamente não porque a minha palavra passe a vós eu fico vazio de palavras ao conversar convosco. Ao emitir a minha voz, eu me proponho ordenar a matéria que está desordenada em vós. Da mesma forma que o Verbo, gerado no princípio, depois de fabricar a matéria, gerou por sua vez ele próprio para si mesmo a nossa criação, também eu, regenerado à imitação do Verbo e compreendido que tenho a verdade, trato de organizar a confusão da matéria cuja origem participo. Com efeito, a matéria não é sem princípio como Deus, nem por ser princípio é igual a Deus em poder, mas foi criada e não foi criada por outro, e sim por aquele que é criador de todas as coisas (Discurso contra os gregos, 5).