Gregório de Nissa sobre o castigo do inferno

É preciso, antes de tudo, compreender qual é o objeto da doutrina da ressurreição, em vista do que ele é afirmado pela sagrada Escritura e é objeto de fé. Para descrevê-la sumariamente com uma definição, diremos assim: a ressurreição é a restauração (apokatástasis) da nossa natureza na sua condição originária.

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O propósito de Deus é um só: tornar possível para todos a participação nos bens que se encontram nele, passando por cada um dos homens, toda a plenitude de nossa natureza – falo seja dos homens que se purificaram do mal já nesta vida, seja daqueles que, depois desta vida, foram curados pelo fogo por um período de tempo conveniente, seja daqueles que nesta vida não conheceram nem o bem nem o mal. A propósito desses bens, a Escritura diz que nenhum olho jamais os viu, nem ouvido jamais os ouviu, nem pensamento jamais os atingiu. Na minha opinião, esses podem encontrar-se somente em Deus mesmo: o bem que se encontra acima do ouvido, da visão e do coração é o ser mesmo que transcende o universo. Quanto à diferença entre uma vida segundo a virtude e uma vida segundo o vício, ela aparecerá sobretudo na vida futura, onde a participação na felicidade esperada será mais rápida ou mais tardia. Com efeito, à medida do mal sobrevindo em cada um corresponderá perfeitamente a duração mesma da cura. A cura da alma consiste na purificação do mal; e esta, como se provou precedentemente, não poderá realizar-se sem um estado de sofrimento. Mas poder-se-á reconhecer melhor o que as objeções têm de extravagância e de inconveniência se nos inclinarmos para a profundidade da sabedoria do Apóstolo (A alma e a ressurreição, VI).