George Florovsky sobre Agostinho e a autoridade da Igreja

No mesmo sentido nós temos que interpretar a bem conhecida e simplesmente surpreendente afirmativa de Santo Agostinho: Ego vero Evangelio non crederem, ni si catholicae Ecclesiae commoveret auctoritas [Na verdade, eu não teria acreditado no Evangelho, se a autoridade da Igreja Católica não tivesse me movido para tal (c. epistolam Fundamenti, v.6)]. A frase deve ser lida em seu contexto. Antes de tudo, Santo Agostinho não proferiu essa sentença por sua conta. Ela falava da atitude que um simples fiel deveria tomar, quando confrontado com a exigência herética da autoridade. Nessa situação era apropriado para um simples fiel apelar para a autoridade da Igreja, da qual e na qual, ele tinha recebido o próprio Evangelho; ipsi Evangelio catholicis praedicantibus credidi [Eu acreditei no Evangelho, sendo instruído por pregadores católicos]. O Evangelho e a pregação católica permanecem juntos. Santo Agostinho não tinha a intenção de "subordinar" o Evangelho à Igreja. Ele só queria enfatizar que o "Evangelho" é realmente recebido sempre no contexto da pregação católica da Igreja e simplesmente não pode ser separado da Igreja. Somente nesse contexto ele pode ser acessado e entendido apropriadamente. Na verdade, o testemunho das Escrituras é definitivamente "auto-evidente," mas só para os "fiéis", para aqueles que adquiriram uma certa maturidade "espiritual" — e isso somente é possível dentro da Igreja. Ele opunha a auctoritas desse ensinamento e pregação da Igreja Católica às pretensiosas extravagâncias da exegese maniqueana. O Evangelho não pertencia aos maniqueus. Catholicae Ecclesiae auctoritas [Autoridade da Igreja Católica] não era uma fonte independente de fé. Mas era o princípio indispensável de uma interpretação sadia. Realmente, a sentença pode ser mudada: não se deveria acreditar na Igreja, a não ser movido pelo Evangelho. A relação é estritamente recíproca (A função da tradição na Igreja antiga).