Cirilo de Jerusalém: a Eucaristia é o corpo e o sangue de Cristo

Se ele em pessoa declarou e disse do pão: "Isto é o meu corpo", quem se atreveria a duvidar doravante? E quando ele afirma categoricamente e diz: "Isto é o meu sangue", quem duvidaria dizendo não ser seu sangue? Outrora, em Caná da Galiléia, por própria autoridade, transformou água em vinho. Não será digno de fé quando transforma o vinho em sangue?

(...) Portanto, com toda certeza recebemo-lo como corpo e sangue de Cristo. Em forma de pão te é dado o corpo, em forma de vinho o sangue, para que te tornes, tomando o corpo e o sangue de Cristo, concorpóreo e consanguíneo com Cristo. Assim nos tornamos portadores de Cristo (cristóforos), sendo nossos membros penetrados por seu corpo e sangue. Desse modo, como diz o bem-aventurado Pedro, "tornamo-nos participantes da natureza divina" (2 Pd. 1:4).

Falando, outrora, aos judeus Cristo dizia: "Se não comerdes minha carne e não beberdes meu sangue, não tereis a vida em vós" (Jo. 6:53). Como não entendessem espiritualmente o que era dito, escandalizados, se retiraram, imaginando que o Salvador os incitava a comer carne humana.

(...) Na nova aliança o pão celeste e o cálice de salvação santificam a alma e o corpo. Pois, como o pão se adequa ao corpo, assim o Verbo se harmoniza com a alma.

Não consideres, portanto, o pão e o vinho como simples elementos. São, conforme a afirmação do Mestre, corpo e sangue. Se os sentidos isto te sugerem, a fé te confirma. Não julgues o que se propõe segundo o gosto, mas pela fé tem firme certeza de que foste julgado digno do corpo e sangue de Cristo.

(...) Tendo aprendido e estando seguro de que o que parece pão não é pão, ainda que pareça pelo gosto, mas o corpo de Cristo, e o que parece vinho não é vinho, mesmo que o gosto o queira, mas o sangue de Cristo (...), fortalece o teu coração, tomando este pão como espiritual e regozije-se o semblante de tua alma (Leituras Catequéticas, 22).

Depois de santificados por esses hinos espirituais, suplicamos ao Deus benigno que envie o Espírito Santo sobre os dons colocados, para fazer do pão corpo de Cristo e do vinho sangue de Cristo. Pois tudo o que o Espírito Santo toca é santificado e transformado.

(...) Depois dessas coisas, ouvis o cantor que, com uma melodia divina, vos convida à comunhão dos santos mistérios, dizendo: "Provai e vede como o Senhor é bom" (Sl. 33:9). Não confieis o julgamento ao gosto corporal, mas à fé inabalável. Pois provando não provais pão e vinho, mas o corpo e sangue de Cristo que aqueles significam.

Ao te aproximares [da comunhão], não vás com as palmas das mãos estendidas, nem com os dedos separados; mas faze com a mão esquerda um trono para a direita como quem deve receber um Rei e no côncavo da mão espalmada recebe o corpo de Cristo, dizendo: "Amém". Com segurança, então, santificando teu olhos pelo contato do corpo sagrado, toma-o e cuida de nada se perder. Pois se algo perderes é como se tivesses perdido um dos próprios membros. Dize-me: se alguém te oferecesse lâminas de ouro, não as guardarias com toda a segurança, cuidando que nada delas se perdesse ou fosses prejudicado? Não cuidarás, pois, com muito mais segurança de um objeto mais precioso que ouro e pedras preciosas, para dele não perderes uma migalha sequer?

Depois de teres comungado o corpo de Cristo, aproxima-te também do cálice do seu sangue. Não estendas as mãos, mas inclinando-te, e num gesto de adoração e respeito, dize "amém". Santifica-te tomando também o sangue de Cristo. E enquanto teus lábios ainda estão úmidos, roça-os de leve com tuas mãos e santifica teus olhos, tua fronte e teus outros sentidos. Depois, ao esperares as orações [finais], rende graças a Deus que te julgou digno de tamanhos mistérios (Leituras Catequéticas, 23).