Gregório de Nazianzo sobre o sacrifício de Cristo

Examinemos agora outro fato e dogma, negligenciado por muitos, mas em meu julgamento bastante digno de ser estudado. Para quem foi oferecido o sangue que foi derramado por nós, e por que foi derramado? Refiro-me ao sangue famoso e precioso de nosso Deus, Sumo Sacerdote e Sacrifício. Estávamos detidos em escravidão pelo diabo, vendidos ao pecado e recebendo prazer em troca de iniquidade. Agora, uma vez que um resgate pertence apenas àquele que detém o escravo, pergunto: a quem foi oferecido, e com que causa? Se para o diabo, que grande ultraje! Se o ladrão recebe um resgate, não apenas de Deus, mas um resgate que consiste no próprio Deus, e tem um tão ilustre pagamento por sua tirania - um pagamento pelo qual seria certo para ele deixar-nos sozinhos completamente. Mas se para o Pai, eu pergunto, como? Pois não era por ele que estávamos oprimidos; e, ainda mais: com base em que princípio o sangue do Filho Unigênito alegra o Pai, que nem mesmo receberia Isaque, quando estava sendo oferecido por seu pai [Abraão], mudando o sacrifício e colocando um animal em lugar da vítima humana? Não é evidente que o Pai aceita-o, mas não pede por ele, nem necessita-o? Mas por causa da encarnação, e porque a humanidade precisava ser santificada pela humanidade de Deus, para que ele pudesse livrar-nos, destruindo a tirania e trazendo-nos para si pela mediação do Filho, o qual também arranjou isso para a honra do Pai (a quem ele manifestamente obedece em todas as coisas)? (Discurso 45).

Veja, em seguida, a sujeição pela qual sujeita-se o Filho ao Pai. Ora, dirá, não está ele agora sujeito, ou precisa ele, sendo Deus, estar sujeito a Deus? Assim você constrói seu argumento como se fosse acerca de um ladrão ou, ou alguma divindade hostil. Mas veja da seguinte maneira: que ele foi chamado maldição por minha causa, aquele que destruiu minha maldição; e pecado, aquele que tira o pecado do mundo; e tornou-se um novo Adão para tomar o lugar do velho; assim também ele fez minha desobediência ser sua como Cabeça de todo o corpo. Desse modo, enquanto eu for desobediente e rebelde, pela negação de Deus e por minhas paixões, também Cristo será chamado desobediente por minha causa. Mas quando todas as coisas forem sujeitas a ele, por um lado pelo reconhecimento dele, e por outro por uma reforma, então ele próprio também cumprirá sua submissão [ao Pai], trazendo-nos, a quem ele salvou, a Deus. Pois essa é, de acordo com minha visão, a sujeição de Cristo, ou seja, o cumprimento da vontade do Pai. Mas, como o Filho tudo sujeita ao Pai, também o Pai ao Filho; um por sua obra, outro por sua boa vontade, como dissemos. E assim aquele que sujeita apresenta a Deus as coisas que ele sujeita, fazendo sua a nossa condição. Do mesmo tipo, parece-me, é a expressão: "Meu Deus, meu Deus, por que me abandonaste?". Não foi ele [Cristo] quem foi abandonado pelo Pai ou por sua própria divindade, como alguns imaginaram, como se estivesse com medo da paixão e assim se afastasse dele nos sofrimentos (pois quem o compeliu a nascer na terra, ou ser levantado na cruz?). Mas, conforme disse, ele estava representando-nos em sua pessoa. Pois nós éramos esquecidos e desprezados antes, mas agora, pelos sofrimentos daquele que não pode sofrer, fomos levantados e salvos. Similarmente, ele torna suas as nossas transgressões e tolices; e diz o que segue no Salmo, pois é muito evidente que o Salmo refere-se a Cristo (Discurso 30).